O
princípio da discricionariedade consiste numa liberdade conferida por lei á
administração para que esta, entre as várias alternativas existentes, escolha a
actuação jurídica que pretende adoptar. Esta ideia da “liberdade” pode dizer
respeito a três tipos diferentes de escolhas: i) a escolha entre agir ou não
agir (discricionariedade de acção); ii) a escolha entre duas ou mais
possibilidades de actuação predefinidas por lei (discricionariedade de
escolha); iii) a escolha da criação de uma actuação concreta dentro dos limites
jurídicos aplicáveis (discricionariedade criativa). Estes três tipos de
modalidades de discricionariedade não são modalidades autónomas, ou seja, é
possível encontrar-mos estes três tipos de discricionariedade numa mesma norma.
O poder discricionário da administração consiste pois numa liberdade de escolha
entre varias alternativas, mas a discricionariedade só será possível se a
própria norma conferir essa possibilidade á administração, ou seja, é a própria
norma jurídica que confere a possibilidade de a administração optar pelas
alternativas que a própria norma jurídica deixou ao seu critério. Esta possibilidade
discricionária pode-se encontrar presente na estatuição ou na previsão da norma
jurídica e o decisor administrativo terá de, a partir do caso concreto, adoptar
critérios de actuação e este exercício da discricionariedade implica sempre um
raciocínio entre a adopção dos critérios para a actuação do decisor
administrativo perante o caso concreto e a adequação da actuação adoptada em
relação a prossecução do interesse publico em questão, e a este raciocínio
implica sempre uma formulação chamada juízos de prognose que consiste numa
estimativa acerca da evolução futura de situações da vida.
Discute-se
na doutrina a possibilidade de o poder discricionário se autonomizar em relação
a actos vinculativos da administração e a actos discricionários da administração,
mas na minha opinião estas duas realidades não poderão ser autonomizadas, pelo
contrario elas encontram-se presentes na mesma realidade, ou seja, a
administração ao actuar discricionariamente terá sempre de se encontrar
vinculada aos critérios existentes da norma jurídica, não podendo afastar-se
desses mesmos critérios. Aqui encontra-mos uma limitação á actuação
discricionária, o poder discricionário não confere á administração a
possibilidade de margem de livre actuação, a administração encontra-se sempre
vinculada a realizar a actuação que a norma jurídica estabelece como uma das várias
alternativas. Sendo certo que os actos discricionários se encontram limitados
por certos vínculos, cabe agora definir que vínculos são estes a que os actos
discricionários praticados pela administração se encontram limitados, e aqui
importa distinguir dois tipos de vínculos: i) quanto á competência (se o
decisor administrativo pratica o acto dentro das suas competências); ii) quanto
ao fim (o fim a que foi incumbido dentro da sua competência, aqui podemos
encontrar a questão do vicio de poder, na medida em que a administração pode
desviar-se do fim a que foi proposto, ex: Desvio de um fim publico para um fim
privado). Com o fenómeno do direito administrativo cada vez mais “europeizado”
é possível referir um alargamento destes vínculos do poder discricionário por
contributo da União Europeia, como exemplo disso o princípio da prevenção/precaução
no âmbito do direito do ambiente, em que se terá de fazer juízos de aplicação
em termos de presente e em termos de futuro. Este alargamento de princípios não
se verificou somente através da União Europeia, mas a própria Constituição
introduz alguns vínculos ao poder discricionário da administração, como exemplo
temos a questão da prossecução do interesse público e direito dos particulares
face a administração, ou seja, fins constitucionais que a administração terá de
ter em conta durante a escolha da sua actuação no âmbito do poder
discricionário, e teremos ainda o respeito pelos princípios da legalidade, da
igualdade, da proporcionalidade, imparcialidade, entre outros que terão de ser
respeitados por parte da administração.
No
fundo podemos verificar que o poder discricionário, sendo uma liberdade
conferida pela lei para que a administração adopte a sua forma de actuação, não
e um poder que confira a possibilidade de a administração actuar da forma que
quiser, existindo dentro da própria realidade de poder discricionário vínculos
que limitam esta actuação por parte da administração de forma a que não existam
desvios de actuação contrários ao fim que a norma jurídica que conferiu
discricionariedade á administração pretendia que fosse realizado.
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